por Elza Helena

Ao ler um livro, um poema ou simplesmente um texto que destaca a dança como tema principal, logo desperto a sinestesia, a imaginação do cenário, dos personagens, o figurino, a respiração, a transpiração, os movimentos…
Tento associar as expressões corporais descritas, as palavras que inspiraram o autor naquele exato momento, que trazem à tona lembranças principalmente de experiências emotivas.
A linguagem corporal, assim como a escrita é repleta de um conteúdo especial, com muita sensibilidade, onde podemos enxergar através das formas representativas a exteriorização dos sentimentos.
Para criarem com o público uma perfeita sintonia, assim como o escritor necessita da interação do leitor em seu texto, os bailarinos em seus vários estilos, trabalham nos movimentos conflitos, dramas, poesia, comédia… O corpo fala, provoca, instiga, sensibiliza, desmistifica, conduz a imaginação, assim como qualquer gênero literário, a dança pode criar uma perfeita dialética que encanta e inspira, que alegra ou entristece.
A dança requer que os bailarinos saibam interpretar e usar os movimentos com liberdade em suas performances fazendo com que o bailar dos movimentos ritmados e envolventes, falem por si, como palavras que voam em nossa direção em forma de gestos, passos, giros, saltos… Posso ter sensações diferentes ao ler um livro e assistir um espetáculo, mas a emoção será sempre indescritível.
Sabemos que desde os primórdios da humanidade, que o ser humano usa a dança como a voz do corpo e da alma, para celebrar a morte ou a vida, levando através dos tempos a dança por diversos caminhos e criando uma rica diversidade cultural. Desde os folguedos populares aos ritos folclóricos, o balé clássico ao contemporâneo… Há várias possibilidades para transformar a beleza do movimento do corpo num vôo das palavras com o destino a imaginação refletindo o pulsar de cada passo em harmonia com a música.
Alguns autores brasileiros usaram personagens e cenários relacionados à dança em seus livros, contos, crônicas, poemas… Abaixo deixo o exemplo do poema A Valsa de Casimiro de Abreu e espero que a emoção da dança envolva o seu coração.
A valsa
Tu, ontem,
Na dança
Que cansa,
Voavas
Co’as faces
Em rosas
Formosas
De vivo,
Lascivo
Carmim;
Na valsa
Tão falsa,
Corrias,
Fugias,
Ardente,
Contente,
Tranqüila,
Serena,
Sem pena
De mim!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!…
— Não negues,
Não mintas…
— Eu vi!…
Valsavas:
— Teus belos
Cabelos,
Já soltos,
Revoltos,
Saltavam,
Voavam,
Brincavam
No colo
Que é meu;
E os olhos
Escuros
Tão puros,
Os olhos
Perjuros
Volvias,
Tremias,
Sorrias,
P’ra outro
Não eu!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!…
— Não negues,
Não mintas…
— Eu vi!…
Meu Deus!
Eras bela
Donzela,
Valsando,
Sorrindo,
Fugindo,
Qual silfo
Risonho
Que em sonho
Nos vem!
Mas esse
Sorriso
Tão liso
Que tinhas
Nos lábios
De rosa,
Formosa,
Tu davas,
Mandavas
A quem ?!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!…
— Não negues,
Não mintas,..
— Eu vi!…
Calado,
Sózinho,
Mesquinho,
Em zelos
Ardendo,
Eu vi-te
Correndo
Tão falsa
Na valsa
Veloz!
Eu triste
Vi tudo!
Mas mudo
Não tive
Nas galas
Das salas,
Nem falas,
Nem cantos,
Nem prantos,
Nem voz!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!…
— Não negues
Não mintas…
— Eu vi!
Na valsa
Cansaste;
Ficaste
Prostrada,
Turbada!
Pensavas,
Cismavas,
E estavas
Tão pálida
Então;
Qual pálida
Rosa
Mimosa
No vale
Do vento
Cruento
Batida,
Caída
Sem vida.
No chão!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!…
— Não negues,
Não mintas…
Eu vi!
Rio — 1858. Publicado no livro As primaveras. Poema integrante da série Livro II.

Elza Helena, nasceu em Recife/PE, professora, psicopedagoga, autora de histórias infantis, apaixonada por esse universo encantador onde flui imaginação e criatividade. Em 2018 participou de várias antologias de contos e poesias. Em 2019 está participando de vários projetos.
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