Por Alice Maulaz
Sempre fui uma criança curiosa e uma vez sentada na varanda com minha vó eu perguntei o porquê de ela falar tanto sozinha; foi quando ela me observou atentamente e, logo em seguida, surpresa com o meu questionamento, ela respondeu algo um tanto inesperado: ela simplesmente se sentia melhor falando sozinha do que falar com pessoas que não a entendiam.
Na literatura, os grandes personagens icônicos dialogam, muitas das vezes, com eles mesmos sobre tudo. Como a memorável obra de Virginia Woolf, Mrs. Dalloway, temos muitas das vezes o questionamento sobre a existência da sociedade daquela época e como Londres poderia ser representada como um grande cenário caótico mesmo em tempos tão floridos como na primavera. E acredite, Londres é ainda mais poética na primavera, até na hora de atravessar a Victoria Street.
Aqui no Brasil, uma das autoras referências neste tema é definitivamente Clarice Lispector. Este nome vai muito além que postagens em redes sociais sobre pensamentos profundos…Clarice foi simplesmente ela mesma e o que ela pensava desde sempre tanto dentro quanto fora de suas obras. O conceito de fluxo de consciência pode ser explicado como bem desenvolvido por Júlio Cesar Anjos, uma maneira de filosofar sobre as coisas com conexões fundamentadas durante o enredo.
E quantas vezes nos questionamos sobre tudo sem ao menos dizer uma palavra? Afinal, é difícil ser entendido e, mais ainda, entender o outro, já que somos muitas vezes julgados por refletir naqueles dias que tudo parece não fazer o menor sentido. Ah, pensar e questionar farão sempre parte do ser humano, sem sombra de dúvidas, e nós não somos formados somente de dias de glória, mas por tantos outros dias de luta. Quanto mais lemos, mais difícil é entender quem somos, mas digamos que Clarice é uma das leituras que faço quando eu gosto de entender menos as coisas de fato.
E simplesmente admirar…o ato pleno de ir. Viajar em boas leituras. Ir e admirar cada momento como encontramos em um dos meus trechos favoritos de A hora da estrela: “… irei até onde o ar termina, irei até onde a grande ventania se solta uivando, irei até onde o vácuo faz uma curva, irei aonde meu fôlego me levar”.
E, na literatura, continuaremos indo contigo, Clarice.
Alice Maulaz é escritora, professora, tradutora e wanderlust. Apaixonada por idiomas e viagens, escreve desde os 10 anos de idade sobre o seu próprio país das maravilhas.
Sempre gostei de Clarice, um desafio ler qualquer livro dessa mulher extraordinária e única. A hora da Estrela, ainda no ensino médio foi um negócio que até hoje não sei explicar e depois, da faculdade de Letras, fiz um semestre só sobre as obras dela, foi deleite e sacrifício, ou como já disse Camões sobre o amor, tb ler Clarice “é fogo que arde sem se ver.”
Realmente, muitas vezes conversar sozinho é buscar alguém inteligente e que nos compreendem totalmente!
Maravilhoso texto!